sexta-feira, 25 de junho de 2010

Observador Itinerante

Eu mal costumo sair de casa. Esse hábito estranho de reclusão permanente é apenas mais um do meu amplo repertório de anormalidades comportamentais. Por conta disso, os ambientes aqui retratados se tornam repetitivos e comuns; centros de estudo que frequento, ruas e ônibus. Principalmente os ônibus. Odeio trafegar dentro deles; tenho a preferência de andar a pé, maneira a qual atravesso os bairros mais próximos. Atualmente, mais do que nunca na minha vida, venho sendo um passageiro constante desse maldito veículo motor, transportador de carne humana. Passo mais ou menos duas horas, somando ida e volta, da zona norte à zona sul, onde moro e onde estudo, respectivamente. Nem reclamo muito porque sei que tem gente em situação pior, que mora bem mais longe, literalmente na puta-que-pariu. A típica comparação do "quem se fode mais"...



A solução é aproveitar a situação, tirar algum conhecimento dessa experiência diária. Quando me enjôo de ficar lendo algum e-book qualquer no celular, começo a observar atentamene as pessoas que estão dentro do ônibus ao meu redor. Faço isso principalmente à noite, quando a grande maioria dos trabalhadores lota o busão voltando do trabalho para casa. Não é que as aulas de Geografia estavam certas em relação a "cidade dormitório"? Assim tenho o "privilégio" de ver todos os tipos de pessoas, um prato cheio para um permanente observador bisonho-silencioso feito eu. Agindo com descrição, registro as minhas aulas práticas de comportamento humano que diariamente, assisto e presencio.
Por exemplo, já pude constatar que um as mulheres da espécie humana conhecidas como patricinhas quando crescem, continuam a andar juntas em bando sejam colegas de trabalho ou jovens universitárias gostosinhas que eu nunca vou comer. Isso eu percebo pelos uniformes, pastas e cadernos que carregam. Os assuntos continuam sendo sobre as mais absurdas futilidades possíveis (Amiga, gostou da cor do meu esmalte?) e os costumeiros mexericos continuam a rolar soltos (Sabe com quem a Mônica fez sexo oral na festa de ontem?). E todas continuam fazendo questão de exibir aquelas enormes alianças de compromisso no dedo, dadas pelos namorados cornos bombadões de academia. Ok, nessa última frase eu parti pra minha imaginação de invejoso, confesso...



A classe das piranhas é facilmente reconhecida pelas roupas com um baita decote e jeans apertado (e ainda olham torto para os tarados que olham descaradamente feito eu) e por atenderem o celular a todo o momento (provavelmente os clientes ligando, se é que esta me entendendo...); o maldito aparelho delas toca direto (geralmente o ringtone é algum funk) incomodando o ”silêncio de nossa viagem” mais do que os vendedores de bala (esses caras merecem um texto só para eles), que entram um após o outro nos ônibus. Elas atendem com um ”Oi, bem” e começam a tagarelar sem parar, irritando os nossos tímpanos.



Em casos como esse entram em cena os "inibidores de som do ambiente externo", sacados rapidamente das bolsas surgem os mais variados aparelhos como os celulares, Ipods e tocadores de MP3 que entram em ação, para que ao menos se possa ouvir, um barulho selecionado, que agrade mais ao ouvinte. Um agradável toque de música personalizado, nesse corre-corre do dia-a-dia é algo individualista que fazemos pro nosso bem e sáude mental, eu diria. Afinal, ninguém gosta de ser obrigado a ouvir coisas como as mais diversas reclamações à respeito de mais um dia de trabalho, por parte de desconhecidos terceiros.



Também pude perceber diferenças de comportamento explícitas sobre o homem e a mulher. Diante de um destino de chegada desconhecido, por exemplo, a mulher imediatamente pergunta ao motorista, cobrador ou a alguma alma caridosa, onde fica o tal lugar, pedindo logo uma referência ou algo do tipo. Sendo mais ”sem vergonha” do que o homem, no bom sentido do termo, a mulher é inegavelmente mais prática que o homems para conquistar o seu objetivo, no qual consegue sucesso . Já o homem, se porta como um ser independente, desbravador, conhecedor e supostamente criador do seu próprio caminho. O homem tenta ser uma espécie de pioneiro e se fode. Quando está para soltar em um ambiente que desconhece, levanta-se e tal qual um navegante a procura de novas terras, procura avistar algo, um ponto de referência mesmo que completamente desconhecido. O orgulho aqui fala mais alto. Às vezes dá certo, outras nem tanto.



As diferenças de classe sociais no ônibus também ficam bem nítidas pelo seu comportamento. Além da roupa, o comportamento em um ambiente fechado tal qual o transporte coletivo diz muito sobre a pessoa, sua origem. Existem os exibicionistas carentes por atenção em ambas as classes. O pobre como vem geralmente de alguma comunidade barra pesada do Rio, para chamar atenção ou canta algum funk ou conversa em voz alta à respeito do lado ruim da favela que se vê nesses programas que exploram a tragédia humana: tiroteio, bala-perdida, confronto com a polícia, drogas, esse tipo de assunto. Já o rico fala em voz alta no seu celular de última geração sobre o sucesso de seus negócios, alguma festa badalada que frequentou no fim de semana ou gaba-se por viajar para o exterior ou frequentar uma faculdade prestigiada. Enfim, ambos expressam os seus mundinhos infernais ou angelicais. Talvez ajam de forma inconsciente, fazendo esse tipo de papo fluir naturalmente, como se estivessem em piloto-automático das suas rodinhas sociais. Sempre a mesma ladainha irritante.
Cuidado ao andar de ônibus. Cuidado com o que diz e com suas atitudes. Elas dizem muito sobre você, portanto vigie-se permanentemente. Você pode estar sendo observado e analisado por algum outro babaca desocupado feito eu e acabar sendo ridicularizado num blog de quinta categoria. Um simples passageiro do seu lado pode ser um escritor medíocre debochado e irônico. Lembre-se sempre disso ao sair de casa.

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