sexta-feira, 28 de outubro de 2011

O Fim De Um Ultrarromântico

Há tempos atrás eu tive a ideia de escrever essa crônica. Ficava no “escrevo” ou “não escrevo” e enfim resolvi escrevê-la. A maior parte das crônicas que escrevo são recheadas de piadas autodepreciativas. Não pretendo fazer (muito) isso dessa vez. Mesmo assim, acredito que esta seja uma das minhas crônicas que mais abre espaço para gracejos sobre a minha pessoa. Não me importo. Meu compromisso não é mentir; é contar a verdade, doa a quem doer, da minha vida vacilante. Sou daquele tipo de pessoa que não se preocupa em zelar pela sua reputação, porque sequer tenho uma (que eu saiba). Se estou escrevendo esta crônica, me abrindo e me ridicularizando em praça pública é porque tenho um bom motivo para isso. Decepcionei-me recentemente e por isso pretendo me distrair um pouco escrevendo. Talvez assim eu consiga por a cabeça no lugar novamente. Sei que o mais normal seria procurar uma pessoa para conversar, mas não quero encher o saco de ninguém por mais um fracasso na minha vida pessoal. Garotos não choram. No blog, pelo menos, fica sabendo quem quiser. 


Dessa vez a linha de pensamento que irei expor não se manteve apenas na lengalenga da idealização panfletária. O que quero dizer é que a coloquei em prática recentemente; no final da crônica eu conto o desfecho dessa experiência. Ela é uma proposta de mudança de rumo na vida afetiva, ou melhor dizendo, de mudança de percepção. Esperava que essa experiência prática tivesse um final mais bacana para alegrar vossos corações e principalmente o meu. Não considero a ideia um fracasso total, ela só não funcionou (para mim) dessa vez. Não dá para por a culpa do som ruim sempre no instrumento. Às vezes é mais fácil simplesmente trocar o instrumentista.


Descobri que eu era ultrarromântico quando estudei ultrarromantismo nas aulas de literatura do ensino médio. Não vou dar aula de literatura aqui de graça. Caso você não saiba ou não se lembre o que é o ultrarromantismo pesquise por aí Google afora. Em um primeiro momento eu fazia chacota com o ultrarromantismo e os seus poetas chorões emotivos. Lembro até de uma piada que eu fiz, quando a professora de literatura disse que as mulheres no ultrarromantismo eram seres inatingíveis. Eu disse: “Joga uma pedra nelas então” e consegui arrancar alguns risos dos meus vizinhos de sala de aula. Embora ela tenha sido dita há quatro anos atrás, foi fácil me lembrar dessa piada. Minhas piadas geralmente são tão ruins que quando consigo fazer uma boa digna de risadas, guardo-a na memória para compartilhar com outras pessoas posteriormente. O que começou com um deboche foi ganhando seriedade; aos poucos eu fui me identificando com as poesias ultrarromânticas. Até hoje as únicas poesias que eu tenho alguma sensibilidade para compreender são as ultrarromânticas. Houve até uma época em que eu fiquei fascinado com os poemas do Álvares de Azevedo; ficava deitado lendo as suas poesias, imaginando que a amada enaltecida nos seus poemas era uma garota que eu gostava. Isso ocorria até que de uma forma bem inocente, para grande surpresa de um tarado discreto e inofensivo que nem eu. Não devia ter dito isso! Espero que ninguém tenha entendido...


Um dos temas recorrentes na poesia ultrarromântica é a idealização da pessoa amada. Sabe aquela velha história do amor platônico? Do amor que só existe na cabeça de uma pessoa e que jamais se concretiza no mundo real? É exatamente disso que se trata. Eu me rendia a esse tipo de amor frequentemente. Todo ano eu escolhia uma musa para ficar sonhando, mas nunca dizia nada para as ditas cujas; quando terminava o ano eu as esquecia, como que por encanto, e no ano seguinte elegia uma nova. Esse foi um ciclo vicioso que se repetiu ano a ano, desde a minha quarta série do primário.
O problema é que isso não era amor de verdade. Era apenas encanto. Eu estava encantado com a beleza de pessoas que sequer conhecia de verdade. O amor anda muito banalizado. Acredito que para se amar alguém deve se conhecer primeiro mais a fundo. Bater um papo para sacar qual que é a dela. Não acredito nessa história de amor à primeira vista. Tesão a primeira vista é viável e compreensível. Amor não.
Outro erro que cometi foi aferir a essas garotas uma aura de pureza inexistente.  Só percebi o quanto fazer isso é idiota quando uma vez vi uma garota belíssima, pela qual me senti encantado. Para mim ela era como um anjo. Aí em outro momento eu a observei de longe, fumando cigarro e xingando altos palavrões sem a menor necessidade. A imagem imaculada desmoronou-se: ela era humana assim como eu, com seus defeitos e qualidades. Para ser feliz nesse mundo é necessário ser menos exigente, diminuir os próprios critérios de escolha, contentando-se com o que o mundo tem a oferecer de melhor. Isso porque a pessoa perfeita não existe. Não se deve desperdiçar a vida procurando-a.


É por essas e outras que penso ser uma grande tolice não se achar bom o suficiente para uma pessoa e sofrer em silêncio, por causa de um amor platônico que sequer sabe que você existe. Isso parece até letra de um pagode meloso. Em parte, culpo a mídia por ter tido essa fase de idealização da minha vida romântica. Em filmes e músicas, insistem tanto na ideia de que só existe uma pessoa ideal para cada um, que acabamos acreditando realmente que isso seja verdade. Acreditar nisso traz conseqüências negativas para a vida de uma pessoa. Quando ela conhece alguém especial, ela acredita que enfim encontrou a sua alma gêmea. Assim ela trava diante dela cheia de medo; não age, pensando na pior probabilidade possível, que é o fracasso, muitas vezes irreversível.
É tolice também ficar com medo de ser rejeitado; não falar nada para se poupar de uma exposição ao ridículo. Para quê ficar só idealizando? Só se vive uma vez. Não canso de dizer aqui “Se você tem algo para dizer diga”. Dessa vez eu disse. Solidifiquei esta teoria na minha cabeça e resolvi pô-la em prática no mundo real. É ai que enfim chegamos ao desfecho, ao menos parcial, dessa história.
Não vou transcrever os pormenores. Vou-me poupar. Espetacularizar a própria desgraça tem lá os seus limites. Basta dizer que eu estava interessado em uma garota, com quem tinha breves contatos durante a semana. Resolvi agir, convidando-a para sair. Ela disse que não seria possível porque namorava. Não quero parecer injusto. Ela disse tudo de uma forma bem doce, educada e compreensiva. Acho que isso até me fez sentir pior ainda.
A culpa é toda minha. Devia ter me informado antes de perguntar. Me iludi. É típico de mim se apaixonar por qualquer uma com um rostinho bonito que me dá um pouco de atenção. Gostou da frase? Eu também. Ela é boa, mas não é minha. A ouvi no filme Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças. Filme legal.


Assim me despedi dela e sai da cena rindo da situação, obviamente de nervosismo e não de felicidade. Não carrego espelho comigo para admirar a minha falta de beleza, mas pude sentir que aos poucos minha expressão facial foi mudando de um lapso risonho até a uma expressão séria e fechada. Restou-me mais uma vez voltar para casa de cabeça reta e mãos no bolso, esperando por mais um final de semana insosso, trancado sozinho em casa.
Até que foi um dia interessante do ponto de vista cômico. Ganhei uma nota nove num trabalho, mas em compensação perdi uma garota que nunca tive. Típica história de nerd fracassado. Pelo menos consegui finalmente baixar a discografia dos Ramones na biblioteca da faculdade. Bom prêmio de consolação.



O fim de um ultrarromântico se decreta quando ele parte para a ação, quando ele enfim se declara. É o tocar no que antes era intocável. É dizer sim a vida e não ao mundo abstrato das ideias. O ultrarromântico se acaba quando diz que quer viver e não quer mais sofrer. Renegue-o, mas não o ignore, porque ele continuará existindo com ou sem a sua aceitação. Não dá para desanimar. Se não foi possível dessa vez, que seja na próxima. Sem drama. Não guardo nenhuma mágoa da garota que foi muito doce em me ouvir e estou sem ressentimentos em relação a mim mesmo porque fiz a minha parte. Só não posso enganar-me, tentando esconder que estou me sentindo decepcionado e descontente com o desfecho. Esta foi apenas mais uma história real que o mundo conta. Não há vilões há serem procurados, nem inimigos a serem combatidos ou odiados. Mais uma vez alguém (eu) teve que sobrar. Por hoje já deu. Me dêem licença agora pois vou procurar um ombro amigo para deitar minha cabeça. 

2 comentários:

  1. Anônimo30/10/11

    Crhistian Daniel mais uma vez mostrando a todos sua sensibilidade admirável! Crhristian, tu é um (e não o) cara! Sinto-me na obrigação de te parabenizar, pois reconheço tua coragem e sinceridade ante esse mundo que não é bom nem ruim. Vai o incentivo: continue escrevendo, que é um prazer lê-lo.

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  2. Valeu, Mr. Anônimo! Por causa do elogio vou até ignorar que você escreveu meu nome errado. rsrs

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