sexta-feira, 27 de maio de 2011

Olhe Nos Meus Olhos

Num dia desses em que eu estava em casa sem ter o que fazer, resolvi assistir mais uma vez ao DVD (pirata por sinal) do filme Funny People (Tá Rindo Do Quê?). O diferencial dessa vez é que assisti ao filme com os comentários do diretor Judd Apatow e dos atores Adam Sandler e Seth Rogen. Um que chamou a minha atenção foi um em particular do diretor Judd Apatow, que nada tinha a ver com o filme. Durante um momento em que os três falavam sobre o bom contato visual que Sandler mantinha em uma das cenas do filme, Apatow comenta que nos primórdios do seu relacionamento com a também atriz Leslie Mann, ela lhe chamava a atenção por causa da sua falta de contato visual durante as conversas. Ele ficava fitando os lábios das pessoas ao invés dos seus olhos e como justificativa dizia que fazia isso para prestar mais atenção nas palavras ditas pelos outros.


Essa história de mal contato visual me lembrou do meu passado pré-adolescente, cujo meu contato visual com as pessoas era pífio, ou melhor dizendo, inexistente. Nunca olhava nos olhos de ninguém. Nem sei bem o porquê. Alguns alegavam que eu era autista e outros alegavam que eu era marrento. Talvez algum psicólogo espertalhão explique-me isso no futuro, no dia em que eu puder pagar um. O fato é que constantemente eu vagava pelo mundo de cabeça baixa, sempre fitando o chão e no âmbito das conversas isso não era diferente.
Que bizarro esse parágrafo anterior. Mais bizarro ainda é que ao escrevê-lo tive um breve sentimento de nostalgia dessa época. E olha que pensei que  jamais teria. Olhando para o chão eu enxergava o mundo de outra perspectiva,  um tanto quanto incomum para a maioria das pessoas. Afinal que pessoa normal fica olhando para o chão o tempo todo? Mesmo assim dá para se surpreender com os detalhes que o chão pode oferecer a seus “apreciadores”. Se você resolver fazer isso por causa da minha influência aprecie com moderação. Desaconselho essa prática porque as outras pessoas não irão te enxergar com bons olhos.
Lentamente o sistema da “normalidade” foi me absorvendo e com o tempo parei com esse hábito esquisito. É difícil desconstruir certos hábitos tão enraizados dentro da gente. Comecei a andar de cabeça erguida (mesmo sem ter motivos para tal), mas ainda faltava o próximo passo: contato visual.
A primeira vez veio em uma conversa comum e foi meio difícil. Achei estranho. Percebi que era necessário me concentrar, olhar a pessoa nos olhos, e ainda prestar atenção no que ela dizia. Fazer isso com sincronia era complicado, mas pelo menos não passei vergonha. Nos meus tempos de “olhos no chão”, apesar de deselegante, prestava mais atenção nas palavras dos outros. Estranheza para muitos, conforto para um.
Antes que me desse conta conseguia fazer contato visual normalmente. Mais uma lição que nem a escola e nem a família se deram ao trabalho de me ensinar e que tive que aprender sozinho, na marra, na escola da vida. Esse processo de humanizar um recluso é mais complicado do que vocês imaginam. Precisa ser lento, gradual e seguro. Já ouvi isso antes em algum lugar. Acho que a comparação não foi a das melhores...


Acho que não fazia isso antes por medo. Dizem que os olhos são a janela da alma de uma pessoa. Meu medo talvez não fosse nem o de olhar nos olhos dos outros e sim ter os meus olhos “olhados” por outras pessoas. Afinal contato visual é um ato recíproco. Meu medo talvez fosse que as pessoas ao olharem nos meus olhos não encontrassem nada por trás dele. Olhos sem vivacidade, olhos sem alma, olhos vazios, como preferir. De vez em quando tem a sensação de que meus olhos são assim: vazios que nem os dos peixes. Não posso saber ao certo porque afinal de contas não é possível olhar para eles o tempo todo e não sou lá um grande fã de espelhos de bolso.


O brilho no olhar. Já pensei que essa expressão fosse mais uma bobagem romântica criada pela indústria do entretenimento. Mas pude constatar que é real. Já conheci algumas garotas que o tinham e muito. Chegando perto o suficiente dava para ver perfeitamente o quanto eles brilhavam. Pareciam até olhos de personagem de mangá. Não se empolguem porque não peguei nenhuma delas. Em comum posso dizer que todas eram pessoas alegres, felizes e de bem com a vida. Sabe felicidade irritante? Não era o caso da felicidade delas. Era mais do tipo felicidade contagiante. Parece que descobri o segredo do brilho nos olhos.


E hoje me irrito quando não me olham nos olhos. Como o mundo dá voltas; anos atrás eu vivia fazendo isso. É muita desconsideração. É como se isso inferiorizasse a pessoa. Uma vez ouvi o jogador de futebol Cicinho falando em um programa esportivo que em sua época de Real Madrid, Raul, capitão do time, na hora de cumprimentá-lo com um aperto de mão, virava a cara para o outro lado. Um claro gesto de desprezo. Impossível não se identificar com a situação. Se bem que na minha vida causo mais torcicolos em garotas do que qualquer coisa.
Portanto olhe nos meus olhos. Olhe nos olhos de todo mundo, aliás. Todos são dignos de atenção e dignos da apreciação de vossas retinas. Se eu não fizer isso em algum momento perdoe-me porque ainda possuo algumas (ou seriam muitas?) sequelas da timidez. Também há o fato de a minha miopia não me deixa enxergar direito. Já estou usando desculpinha que nem o Apatow. Melhor parar por aqui.

PS: O título da postagem me lembrou do Olhar da Penitência do filme do Motoqueiro Fantasma. Look into my eyes!

5 comentários:

  1. Anônimo2/8/11

    Posso constatar após essa segunda leitura que sua escrita me é interessante. Eu sou editor chefe de uma grande corporação que controla muitos meios de comunicação e provavelmente o procurarei, logo que venha a se formar, para que, se for da sua vontade, possa componha nossa redação. Devo alertar para erros de português, que não devem ocorrer em qualquer caso (inferioriza-se por inferiorizasse), portanto, pratique mais.

    Ass.: Aquele que muito vê.

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  2. Obrigado pelos elogios e sugestão anotada!

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  3. Jesse ben Benjamin2/8/11

    Pelo visto também preciso aumentar a freqüência com que escrevo, pois não ando sendo de todo correto.

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  4. Eu não ia falar nada mas... de acordo! rs

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  5. Acabo de criar um blog, Faraó! Se não for incômodo gostaria que desse uma olhada, quando puder é claro, e não economize críticas, pois não escrevo com costume e gostaria de ter uma opinião sincera, anônima e de quem escreve. Aqui segue o link http://contosdefado.blogspot.com/2011/08/titulo-indiferente.html
    Agradeço desde já.

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