segunda-feira, 22 de agosto de 2011

A Garota E O Garoto

O caso de hoje aconteceu dentro de um ônibus, transporte coletivo que uso para ir até à faculdade. Como ele estava parcialmente lotado ficou difícil escolher um bom lugar para sentar. Acabei me sentando na frente. Minha preferência habitual sempre é a dos bancos que só tem lugar para um; chame-me de preconceituoso se quiser, mas pelo menos dessa maneira não tenho que me sentar ao lado dos figurões que ficam ouvindo funk alto no celular, dos cracudos descontrolados, dos obesos que ficam me comprimindo contra eles e de outras figuras características que o acaso me faz o favor de que venham sempre se sentar do meu lado. Por outro lado as boazudas que sem dúvida prefiro como companhia, quando sentam do meu lado no ônibus se levantam na primeira oportunidade para outro lugar bem longe de mim e olha que eu até me comporto direitinho, diferente de certos tarados que praticamente comem as mulheres com os olhos. Para evitar incômodos e constrangimentos que diminuem ainda mais a minha autoestima, prefiro sentar-me sozinho.
Continuando a história, lá estava eu sentado na frente em um desses bancos duplos. Sentei-me no lado do banco que não era o da janela, o que me tornou um alvo fácil para eventuais esbarrões das pessoas que passavam rispidamente pela roleta. Foi aí que entrou uma garota no ônibus.
Como todos os bancos estavam ocupados ela permaneceu de pé. O que estranhei foi o fato de que ela resolveu ficar parada logo do meu lado, próximo à roleta, atrapalhando a passagem dos outros e me comprimindo com a enorme bolsa vermelha a cada vez que um passageiro entrava. Geralmente as pessoas costumam ir para o fundo ou para o meio do ônibus e não ficar paradas do lado da roleta estorvando a passagem dos outros.
Não olhei direito para a cara dela porque não costumo ficar encarando desconhecidos no meio da rua. Olhando de relance deu para reparar que ela tinha cabelos pretos, trajava o uniforme da rede pública de ensino e carregava uma enorme bolsa vermelha como eu disse anteriormente.
Não vou dizer mentiras para pagar de bom moço. Dentro de um ônibus não costumo ceder meu lugar (sou um desses sem-vergonha que fingem que estão dormindo), não seguro bolsa dos outros, não faço contribuições para ONGs ou centros de recuperação (até mesmo porque nem tenho o que doar). Não me orgulho disso, mas é assim que geralmente me comporto. Como dizia em uma tirinha do André Dahmer, “não abro mão do meu egoísmo”. Por isso, mesmo com a bolsa dela me incomodando bastante, aguentei calado o sofrimento esperando pacientemente ela descer do ônibus ou migrar para outro lugar.
Alguns pontos depois subiu um garoto no ônibus. Ele ficou por um tempo parado na porta dianteira do ônibus, ao lado do motorista. Somente depois ele resolveu passar pela roleta. Foi aí que ele disse um tímido “oi” para a garota de nossa história. Pensei logo que ele era um desses garotões querendo dar em cima de garotas inocentes com cantadas baratas, puxando conversa sem sequer conhecê-las. Só que pela resposta dela deu para perceber que eles já se conheciam. Involuntariamente acabei ouvindo os dois conversando. Não sou fofoqueiro, mas como eles resolveram falar do meu lado sua conversa acabou tornando-se parte do domínio público e objeto de inspiração para uma crônica. Algo que eles certamente nem imaginavam que aconteceria.


A conversa foi até breve e sobre assuntos banais da vida escolar. Não sou nenhum Sherlock Holmes, mas deu para perceber que ambos eram estudantes provavelmente da mesma escola. Ele mais veterano que ela e ela logo abaixo, em alguma série inferior. Meu palpite era de que ele estava no 2° ano e ela na 9ª série, que nos meus tempos de estudante era conhecida como 8ª série. Isso porque em um momento o garoto falou sobre log e completou dizendo que a garota algum dia ainda aprenderia o que é sofrer. Ouvindo isso eu não sabia direito se me sentia com saudades ou aliviado de não ter que estudar mais esse tipo de coisa.


Ela conversa tranqüilamente ao contrário dele, cujo nervosismo se observava nas repetitivas interjeições. Em um dado momento o garoto perguntou o que a garota fazia depois da aula e ela respondeu que iria para um curso (de quê eu não sei) e depois para a aula de música. A cada resposta dela, o garoto respondia com um “Caramba!”. Lembrei-me até de um certo alguém que quando a sós conversa com alguma garota descomprometida, a qual possui um tipo de interesse além da amizade, fica falando ”Nossa!” o tempo todo.
O que me chamou a atenção é que deu até mesmo para eu, que não sou nenhum estudioso do comportamento humano, perceber que o cara estava se esforçando para puxar algum assunto com ela, ou melhor dizendo, deu para perceber que ele estava afim dela. Não foi algo muito explícito de perceber, mas deu para notar que ali tinha algo. Às vezes rolava um silêncio constrangedor e era sempre ele que retomava a conversa. Por tal razão nem sei afirmar se ela estava mesmo interessada em conversar com ele ou só não queria passar a imagem de uma pessoa grossa, demonstrando ser simpática respondendo à outra. Eu nunca soube diferenciar bem a simpatia do interesse.
A moral da história é que pude perceber que mesmo o garoto, personagem anônimo da minha crônica, sendo um jovem que frequenta a academia (ao contrário do gordo e velho blogueiro que aqui escreve), não consegue ser muito diferente de mim quando o assunto é mulher. O lamentável disso tudo é que eu sou mais velho e devia parar de agir como um adolescente inseguro em certas ocasiões, faça-se entender: situações de conquista amorosa. Talvez eu nunca mude. Sei que há quem ache a timidez algo charmoso, mas tenho que parar com certas manias. Fazer-me de vítima em relação ao amor é uma delas e está na minha lista de “facetas do meu comportamento bizarro que pretendo mudar futuramente”. Travar, se enrolar todo e não dizer como se sente não são coisas que acontecem só comigo.


O que me deixou ainda mais pensativo foi ter percebido que perdi algumas coisas legais na juventude que certamente nunca mais vou poder recuperar. Tento hoje em dia, mas não é a mesma coisa: as pessoas de 20 anos de idade já estão muito complexas, vividas e desgastadas. A possibilidade de ter uma relação marcada pela inocência fica a cada dia mais difícil. O interesse mútuo predomina, mas não é o interesse pelo alguém e sim pelo o que esse alguém tem a oferecer e que possa te beneficiar. Parece até a Idade Média: unem-se para se fortalecer e obter vantagens próprias e não pelo amor. Os homens vangloriam-se de suas namoradas gostosas e as garotas da maneira que os namorados ganham a vida, só para citar um exemplo. O jeito é deixar as idealizações românticas de lado e jogar esse jogo que todo mundo joga. Ou então ficar sozinho na frente do PC escrevendo sobre um garoto, que diferente de você, ousou ter iniciativa.

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