quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Criatura E Criador

Estou aqui, mais uma vez, fazendo uma brincadeira com o título do post. Geralmente, pelo menos onde volta e meia leio tais palavras escritas juntas, o substantivo criador antecede o também substantivo criatura.  Uma espécie de hierarquização, segundo o grau de importância. Compreensível, afinal sem o criador a criatura inexistiria. A segunda deveria ser dependente da primeira.
Já deu para perceber o ponto em que pretendo chegar. A criatura vem tomando o lugar do criador. Não em relação a sua gênese, porque ela ainda é mérito do criador. Refiro-me a importância, a atenção que ela conseguiu atrair para si. Um relativo distanciamento entre os dois.
Um exemplo clássico é o de Frankstein, clássico de terror da cultura popular. A maioria das pessoas se equivoca. Pensa que Frankstein é o monstro. Frankstein na verdade é o nome do doutor que reuniu partes de diversos defuntos e deu vida ao monstro. Por conta desse engano o monstro usurpa o lugar do doutor e é bem mais famoso. Os erros de adaptações também contribuem para esse equivovo em relação a obra de Mary Shelley.



Voltemos a questão do distanciamento. Já senti isso na pele. Anteriormente, mencionei em outros posts que escrevia histórias em quadrinhos sem fins lucrativos (obviamente: quem iria pagar por desenhos toscos acompanhados por dezenas de palavrões?) em um passado não muito distante. O que acontecia lá era semelhante ao que acontece aqui: a situação se inverte e a criação ganha mais importância que o criador.
Pharaoh é o nome do meu eu lírico. Faz parte de mim, mas de fato não sou eu de verdade. É uma criação minha, uma personagem oriunda do meu confuso mundinho abstrato semi-esquizofrênico. Serve para por a casa (leia-se cabeça) em ordem. A famigerada pessoa cujo nome começa com a letra C, em seu dia-a-dia é um pé no saco. Nem eu me agüento às vezes. Sou preguiçoso, falo pouco, não me expresso, vivo de uma forma desinteressante e estou sempre desinteressado (aparentemente, pelo menos...) por tudo o que rola ao meu redor. Pelo blog, Pharaoh se encarrega disso de forma eficaz e atrai para si toda a atenção. É triste mas admito: meu carisma literário é maior do que meu carisma real. Verifico isso até no MSN, porque lá, vá entender, as desconhecidas as quais às vezes costumo adicionar, me adoram, me acham divertidíssimo. Vá entender. Impressionante como consigo ser mais engraçado escrevendo do que falando. Resumindo: sou melhor companhia quando não estou fisicamente presente.
Nos quadrinhos em que eu escrevia, meu personagem Grotesco-Man se tornara mas importante que eu. E isso extrapolava para a realidade. Chegava ao ponto de eu andar e perguntarem “E aí como vão as histórias?” Nem enxergava maldade neste tipo de colocação. Sentia que era um incentivo carinhoso da parte do público, meus colegas para me estimular o meu talento (se é que se pode chamar escrever quadrinhos esculhambados de talento). Mas não dá para dizer que não me sentia mal com isso. Normalmente, quando você encontra uma pessoa, se pergunta como ela está, não como está o personagem a qual ela escreve. Deu para entender meu drama? Talvez até por isso eu tenha me desinteressado em escrever mais histórias, largado os desenhos e ter me concentrado somente nos textos. Por conta de um ciúme bobo do meu próprio personagem. O ego de um ser humano é uma desgraça...
Nesses meus 20 anos de vida percebi que a coisa melhorzinha que consigo fazer é escrever. Duvido viver essencialmente disso no futuro, principalmente vivendo aqui no meu amado Brasil, onde o hábito de leitura não está muito enraizado na população como um todo. Mas adoraria viver disso. Percebi que para ser um bom escritor é necessário abdicar-se de si mesmo, principalmente quando se está escrevendo alguma ficção. Ninguém fala "Eu li  J.K. Rowling", diz-se "Eu li Harry Potter"; ninguém fala "Eu li Tolkien", diz-se " Eu li O Senhor dos Anéis" e por aí vai. É natural: a autoria ganha menor importância e torna-se refém do personagem ou da obra. Se o escritor tiver um ego enorme, e estiver louco para falar de si não dará muito certo. Por isso que ninguém lê muito auto-biografias. Se tenho um sucesso relativo aqui é porque falo mal de mim mesmo. Portanto meu recado final vai para os que ambicionam ser algum dia escritores-criadores: abaixem a bola e criem personagens mais interessantes que vocês mesmos. É o segredo do sucesso.




PS: Em relação a esse tema, tenho que fazer uma ressalva à Eiichiro Oda, autor do mangá One Piece. O cara não é Robert, nunca faz citação de si mesmo nos seus próprios mangas. Nem mesmo aparece de forma caricata. Mesmo assim,  por votação popular dos próprios leitores da Shonen Jump, foi escolhido como o 48º personagem favorito dos leitores. Esse é o cara!


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